terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

P089-Amizades criadas, umas em acontecimentos vividos outras em lembranças partilhadas

Semanalmente, juntamo-nos em Matosinhos, no Milho Rei, em grupo variável mas sempre numeroso. Em cada encontro aparecem sempre novos nomes, encontram-se amigos do antes, conhecimentos de situações específicas, e geram-se novas amizades criadas com as lembranças de sítios diferentes mas comuns de vivências. Porque em todos os lados as coisas se passaram da mesma maneira: sangue, suor e... lágrimas também.

Na semana passada tivemos o grato prazer da presença do velho combatente e camarada de armas Rui Fernando Alexandrino Ferreira, que passou s suas lembranças de guerra na Guiné para o livro "Rumo a Fulacunda". Nele, o Rui Alexandrino reflecte muito bem o porquê e as condições em que se geraram as amizades:


«…Destacava-se de todas as demais e constitui no presente, sem sombra de dúvidas, não só como o elo que «une» o clã, mas também o fulcro das atenções, o convergir das evocações, «quanto» normalmente, por a todos pertencer, acaba por sobressair nas habituais reuniões, convívios e almoçaradas com que, os antigos combatentes do ex-Ultramar comemoram, um pouco por todo esse imenso Portugal, de lés-a-lés, ano após ano, os acontecimentos, façanhas, peripécias, aventuras e desventuras que ali viveram mas, sobretudo as grandes amizades que por lá se fizeram.
Amizades que alicerçadas nas adversidades e engrandecidas nas agruras da guerra que enobrecendo os sentimentos, criaram a nostalgia dos vinte anos aos quais se passou a associar o cumprimento do serviço militar. Este que na altura, por pesado era mal amado que, assim se viu lenta mas inexoravelmente transfigurado numa agradável melancolia, numa doce recordação, numa eterna saudade.
«Vinte anos» que profundamente marcados pelos penosos, duros e difíceis «tempos de guerra» durante os quais para conservar o equilíbrio emocional houve que «rir» dos tempos e «escarnecer» da guerra.
E se era imperioso aceitar como um facto consumado a fatalidade inevitável de nela ter de participar, muito mais era, quando tudo parecia virar-se contra nós, manter a fé inabalável e conservar a extrema convicção de que, como com tudo quanto ocorre e tem por «palco» esta vida que, sendo ela própria findável e efémera consequentemente o que dela depende ainda que, mau ou muito mau acaba, mais cedo ou mais tarde por ter um fim.
Assim, era com toda a legitimidade que cada um se limitava a esperar e desejar tão somente o final da sua própria comissão que, se parecendo dum incrível e inaceitável egoísmo resultava tão somente do facto de não se ver, não se prever nem mesmo se julgar possível por que maneira ou de que «bendita» forma tal pudesse vir a suceder para todos, com a brevidade que efectivamente se desejava.
Encontrada uma das explicações possíveis para a maneira sui generis como a grande maioria encarou não só a sua participação mas a forma como se comportou em campanha onde, todas as intenções, motivações e acções eram dominadas pelas incertezas e sobressaltos da guerra que, se fizeram emergir a grandeza de alma, a nobreza de comportamentos e a força moral de uns também colocaram em evidência as misérias, referenciando os inseguros, diminuindo os fracos e traumatizando os inadaptados, servindo de prova evidente da mais completa ingenuidade e da total inexperiência que se tinha da vida.»

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