terça-feira, 31 de maio de 2011

P566- PARA QUEM NADA TEM , O POUCO FAZ MUITO...


A POPULAÇÃO DE ELALAB NA GUINÉ-BISSAU TEM RAZÕES PARA SE SENTIR FELIZ
Cercada de rios e riachos. Isolada do mundo. Mereceu o olhar atento dos dirigentes da AD - Acção para o Desenvolvimento, nossa parceira na Guiné-Bissau.
O grito das jovens mulheres a pedir um espaço com o mínimo dos mínimos de higiene e sanidade para poderem dar à luz, foi ouvido e canalizado para a Tabanka – ONG alemã que disponibilizou o dinheiro necessário para se construir o Centro Materno-Infantil e um poço de água potável junto ao mesmo para as necessidades locais de água potável. O Centro Materno Infantil terá três salas: sala de espera, sala de partos e sala de repouso pós-parto.

 O terreno arenoso de acesso a Elalab que dificulta o acesso por via motorizada e é extremamente cansativo na marcha a pé.


Acessos a Elalab

 A população de Elalab na receção dos representantes da Tabanca Pequena.
A nossa Associação Tabanca Pequena, correspondeu com o compromisso de garantir o fornecimento permanente do material sanitário de consumo, como ligaduras, desinfectantes, compressas, material de higiene, e limpeza etc. para apoio às parturientes.
Forneceu também com a colaboração da Associação Viver 100Fronteiras Uma Marquesa para partos, e uma marquesa hospitalar para apetrechar a sala de partos. Forneceu também três camas hospitalares com mesinha de cabeceira, para apetrechar a sala pós-parto.

A AD – Acção para o Desenvolvimento assumiu a preparação técnica das matronas. São mulheres, habitantes locais que vão adquirir conhecimentos de apoio às parturientes na falta de enfermeira ou parteira, para substituírem as “habilidosas” existentes no terreno, as quais até à data têm assistido aos trabalhos de parto em pleno mato ou seja em casa das parturientes sem o mínimo de garantia sanitária, situação que tem sido a causa de muitas mortes de nascituros e quantas vezes a morte das próprias mães, provocada por infecções e pelo tétano.

As obras do Centro Materno-Infantil já começaram, prevendo-se a sua inauguração para Outubro próximo.





Uma morança típica de Elalab

Um dos grandes problemas existentes nesta Tabanca prende-se com a sua situação geográfica. Isolada no terreno pelas bolanhas e riachos, tem uma única saída por terra através de diques que levam cerca de uma hora a percorrer em fila indiana, seguindo-se um areal, onde só potentes viaturas com tracção a quatro rodas podem com muita dificuldade circular. A pé são mais de duas horas para se chegar a Suzana, a povoação mais próxima com acesso via “picada” até S. Domingos.
O sonho da população é ter um barco, que através do rio encurte o tempo de chegada a Suzana para cerca 45 minutos, sem o cansaço da caminhada que teriam de fazer por terra. O isolamento da Tabanca afasta-os da ligação à sociedade. Vivem do que a terra e a água dos rios lhes dá, mas não conseguem juntar dinheiro porque a sistema monetário não funciona.
O Barco seria muito útil não só para transportar pessoas, sobretudo as idosas e ou doentes mas também para transportar bens que podem ser para comercializar nas feiras de povoações próximas, ou para suprir as suas necessidades como a palha para cobrir as moranças.


O Barco que a Tabanca Pequena vai oferecer a Elalab será parecido com este que vemos na imagem e já está em construção.

Mais uma vez o seu apelo foi ouvido. A nossa Associação - Tabanca Pequena, mandou construir um barco de transporte cerca de 30 pessoas que via oferecer à população de Elalab, cujo custo está orçado em 1.500.00 €.
AD – Acção para o Desenvolvimento, ONG comprometeu-se em oferecer o motor para equipar o barco.
Já está em construção. Sairá em breve do Estaleiro.
Apoiando assim as Tabancas perdidas no interior da Guiné-Bissau estamos a contribuir para o bem-estar das populações e consequentemente para a sua ligação à terra-mãe, combatendo a fuga para os grandes centros, onde a miséria é maior e sobretudo se perdem rapidamente a ligação às raízes étnicas e valores aprendidos no colo da mãe.
Zé Teixeira

sexta-feira, 27 de maio de 2011

P565 - ser solidário-BAMBA DI VIDA

A pedido da nossa congênere AJUDA AMIGA aqui fica um convite para os camaradas da zona de Btaga.


quarta-feira, 25 de maio de 2011

P564 - AMINDARA EM FESTA


A alegria no meu coração não tem tamanho.

Foi desta forma que uma mulher grande em Amindara começou o seu “discurso” de agradecimento, na recente visita que uma delegação da Associação Tabanca Pequena fez a esta Tabanca em plena mata do Cantanhez - Guiné-Bissau.

Apesar da nossa chegada coincidir com a hora do grande calor, que convida à sesta debaixo do mais frondoso poilão, Amindara esperava-nos em festa. O batuque já se fazia ouvir ainda não se avistava a tabanca.

A festa



De um lado da picada, a juventude. Tocadores e dançarinas, vestidas com a vestimenta de ir à missa, como se diz na minha aldeia, aprimoravam-se a espelhar a sua alegria e gratidão pelo poço de água aberto ali mesmo ao lado. Do outro lado, homens e mulheres mais velhos, as pessoas importantes da terra, também elas vestidas a rigor com o melhor traje, esperavam-nos com a mesa posta.



 A mesa posta à nossa espera
 O Pitéu
Algumas cadeiras vagas à volta da mesa indiciavam que se destinavam aos “ilustres” visitantes. Cumprimentos afetuosos e prolongados. Olhos nos olhos que teimavam em deixar escapar lágrimas de comoção. Abraços de quem nunca se conhecera antes, mas que se irmanara num sonho – ter água potável ali, mesmo no centro da tabanca.

A palavra “obrigado” era repetida continuamente, enquanto do outro lado da picada o batuque subia de tom para prazer dos nossos olhos e ouvidos enquanto as máquinas fotográficas não se cansavam de fazer clik.

Quão belo é todo este ambiente. Novos e velhos, africanos e brancos em animada festa, passados que são quarenta e tantos anos!

Tempo em que os olhos e ouvidos eram desviados para outros fins que não explorar a beleza do ser humano. Era preciso estar a atento a ruídos ou movimentos estranhos que nos podiam roubar a vida num segundo, e… as máquinas também eram outras.

Somos convidados a saborear um excelente petisco cozinhado para nós com todo o esmero e carinho. Spagheti salteada com ostras. Que saboroso petisco!

Infelizmente não nos avisaram, pois queriam fazer-nos uma surpresa. Para azar nosso tínhamos acabado de almoçar em Faro Sadjuma, ali mesmo ao lado um petisco não menos saboroso. O apetite era pouco, mas deu-se um jeito e lá e se fez o sacrifício. Estive tentado a pedir um taparwere e levar as sobras para Iemberém. eh! eh!



 Eu bebi água fresca e potável em Amindara
As crianças de Amindara saboreiam o momento
Ainda há muito a fazer em termos de educação para uma vida saudável
Seguiram-se pequenos discursos em Nalu traduzidos pelo nosso anfitrião, o Abubakar, delegado da AD- Acção para o Desenvolvimento na Região. O Pepito andava atarefado na organização de um acampamento para 100 jovens em Varela e também porque queria que a festa fosse só nossa, pois foi a Tabanca Pequena que investiu em Amindara. Devo dizer que tive oportunidade de por duas vezes visitar tabancas juntamente com o Pepito. Ele é sempre recebido em festa, tal como fomos nós em Amindara, em Medjo e em Farim.

Discursou o jovem chefe de tabanca, que nos contou um pouco da história de Amindara e das dificuldades que têm tido em conseguir água. Até há um ano atrás ela era transportada de uma fonte no interior da mata e quando essa secava iam buscá-la à Tabanca de S. Francisco. Continuam a não ter escola.

Seguiu-se no discurso uma mulher. Começou com uma frase que dá que pensar.

A alegria no meu coração não tem tamanho, porque eu queria água dar de beber às crianças e não tinha; queria água para cozinhar e não tinha, queria água para lavar a roupa e não tinha…

Quando Pepito ouviu o nosso pedido e disse que iam construir um poço fiquei muito contente. Hoje sou uma mulher feliz.

Seguiu-se outra mulher no discurso. O tema foi o mesmo. Os benefícios para a população por ter água na tabanca. A higiene e limpeza, a pureza da água que reduz as doenças tantas delas fatais, sobretudo nas crianças, as hortinhas de legumes ...

 A mindjer garandi botou discurso pra partir mantenhas gradecer

 
Uma plateia atenta... 

  Para a posteridade.
Agora só falta a escola dizia-me um homem de cabelo branco.

Depois…as palavras parece que se recusavam a sair da minha boca, talvez um pouco aturdido com tanta alegria. Eu estava encantado e feliz, mas não conseguia expressar por palavras este estado de espírito.

Amindara foi o inicio de um projecto. Temos de seguir em frente. contrariamente ao que alguns afirmam, a Guiné-Bissau precisa de abrir muitos poços de água para poder atender às necessidades de uma população em crescimento, cuja idade média de vida é 47 anos.

terça-feira, 24 de maio de 2011

P563 - ACÇÕES DESENVOLVIDAS PELA ASSOCIAÇÃO TABANCA PEQUENA

Na sequência da nossa actividade de angariação de meios para apoio às populações e ao desenvolvimento na Guiné-Bissau, registamos as ofertas provenientes do Clube Lions da Senhora da Hora, da Escola EB 1/2/3 de Leça do Balio e da Associação Viver 100Fronteiras, que fizemos seguir para a Guiné conforme listagem abaixo descriminada.
ARTIGO ORIGEM DESTINO PROJECTO DATA DE ENVIO
2 cx. Medicamentos Rec. em Farmácias
Hospital de Cumura  Panu Branku Maio de 2011
Rec. em Farmácias
Centro de Apoio aos Toxicodependntes Panu Branku
Livros EB 2/3 Leça do Balio
AD - Acção para o Desenvolvimento Nha Terra
Livros EB 2/3 Leça do Balio
AD - Acção para o Desenvolvimento Nha Terra
Livros EB 2/3 Leça do Balio
AD - Acção para o Desenvolvimento Nha Terra
Roupa Adultos Clube Lions / S. Hora
 Tabanca de Elalab / AD Nha Terra
Roupa de Criança Clube Lions / S. Hora
Jardins de Infância do interior da Guiné/AD  Nha Terra
Livros escolares 2º e 3º Ciclo EB 2/3 Leça do Balio
Escola Secundária de S. Domingos/AD Nha Terra
Brinquedos Clube Lions / S. Hora
AD - Acção para o Desenvolvimento Panu Branku
Roupa de Bébé Clube Lions / S. Hora
AD - Acção para o Desenvolvimento Panu Branku
Brinquedos Clube Lions / S. Hora
AD - Acção para o Desenvolvimento Panu Branku
Livros escolares 1º Ciclo  EB 2/3 Leça do Balio
E.V.A.s-Escola de Valorização Agricola/AD Nha Terra
Roupa de Criança Clube Lions / S. Hora
Jardins de Infância do interior da Guiné/AD  Nha Terra
Marquesa hospitalar simples Viver100fronteiras
C.Materno Infantil de Elalab/100fronteiras Elalab
Marquesa genecológica Viver100fronteiras
C.Materno Infantil de Elalab/100fronteiras Elalab
3 Camas Hospitalares Viver100fronteiras
Centro Materno Infantil de Elalab/AD Elalab
3 Mesas de cabeceira Viver100fronteiras
Centro Materno Infantil de Elalab/AD Elalab
20 cx de Sumos Tabanca Pequena
Orfanatos interior da Guiné /100Fronteiras Panu Branku
6 cx Ice Tee Tabanca Pequena Orfanatos interior da Guiné /100Fronteiras Panu Branku

Temos vindo a desenvolver contactos com diversas Instituições de que destaca a nossa presença no DIA ABERTO na Escola EB1/2/3 de Leça do Balio, onde pudemos mostrar aos jovens alunos e professores os nossos projectos de acção direccionados para apoio às populações do interior da Guiné-Bissau.
Em resultado da nossa acção a Direcção da Escola dinamizou de imediato um projecto de recolha de livros didácticos e outros, bem como jogos e brinquedos que fizemos seguir para a Guiné.
A Direcção Escola, presidida pelo Sr. Dr. Manuel Gonçalves, que foi nosso camarada na Guiné, sensibilizada com a nossa acção, demonstrou vontade em que a Semana Aberta do próximo ano escolar tenha como tema a Solidariedade, com um dia destinado à Guiné-Bissau, independentemente de outras possíveis acções de solidariedade dinamizadas pelas turmas.

O Projecto “Sementes e Água Potável para a Guiné-Bissau” prossegue como planeado, estando neste momento em fase avançada a abertura do poço em Farim do Cantanhez, o qual já tem água, faltando colocar as anilhas e a montagem dos equipamentos.

Ainda dentro deste projeto, temos em desenvolvimento uma parceria com o Complexo de Ténis da Câmara Municipal da Maia que pretende dinamizar um Torneio de Ténis nos dias 30 e 31 de Julho cuja receita reverterá integralmente para um novo poço cuja localização será no Djunfunco na Região de Susana – Norte da Guiné.

Djufunco tem uma população de cerca de 810 pessoas, com 180 crianças Crianças.
 Utilizam para consuma, a água de uma  lagoa existente na tabanca,  relativamente grande onde toda a gente vai fazer as suas necessidades fisiológicas, desde banhos a lavagem de roupa




 Fotografias da Lagoa de Djufunco, única fonte de água da tabanca.

É nosso objetivo promover para os  Associados da Tabanca, familiares e amigos uma sardinhada/churrasco no mês de Julho para angariação de fundos destinados a financiar o poço e fontanário de Djufunco que vai ser aberto junto à EVA - Escola de Verificação Ambiental para se poder ensinar motivar as crianças a beberem água de melhor qualidade.

 Zé Teixeira

P562 - LANÇAMENTO DO LIVRO "PICADAS E CAMINHOS DA VIDA NA GUINÉ"

Realizou-se na passada sexta-feira, dia 20/Maio/2011, a cerimónia de lançamento do livro do nosso camarada ex-combatente na Guiné Fernando de Sousa Henriques, que decorreu nas instalações do Museu Militar do Porto.
O autor - Fernando de Sousa Henriques
 
A apresentação do livro e do autor esteve a cargo dos Srs. Coroneis Raul Folques e Castro Neves e contou ainda com a presença do Sr. Tenente General Luís Miguel Morais de Medeiros e do Sr. Dr. José Manuel Pavão na sua qualidade de Consul da Guiné-Bissau no Porto.
Esta cerimónia teve elevada participação de uma assistência interessada e foi complementada com a intervenção da poetisa Dra. Maria Lurdes Anjos e do guitarrista Carlos Andrade, que ofereceram aos presentes deliciosos momentos de poesia e música a condizer com o tema do livro.
O livro relata as aventuras e desventuras de uma viagem que em Abril de 2010 um grupo de 17 pessoas, maioritariamente associados da ONGD – Tabanca Pequena – Grupo de Amigos da Guiné, fizeram a este país, partindo de Bissau e visitando o Sul, o Nordeste, o Centro e terminando no Norte do país. Realça ainda a importância das actividades da Tabanca Pequena e regista a listagem dos seus associados até à data da sua feitura.

 Um aspecto da numerosa assistência
 Autoridades presentes
 O Consul da Guiné-Bissau - Dr. José Manuel Pavão
Os apresentadores da obra literária - Coronel Raul Folques e Coronel Castro Neves
 
Este livro, “Picadas e Caminhos da Vida na Guiné”, é mais uma marca da ligação afectiva que distingue os ex-combatentes da Guiné de uma forma muito particular e que não encontra paralelo nos outros cenários de guerra em que os Portugueses se bateram em nome do dever.

Zé Rodrigues

segunda-feira, 23 de maio de 2011

P561 - CONVÍVIO SEMANAL NO RESTAURANTE MILHO REI

Muito mais que um simples almoço, o convívio semanal que acontece todas as Quartas Feiras no Restaurante Milho Rei em Matosinhos é fundamentalmente um ponto de encontro de pessoas que têm como ponto comum o terem vivido dois dos melhores anos da sua vida envolvidos na guerra colonial que Portugal travou na Guiné.
O grupo tem vindo a crescer. A média de presenças, semanal, anda na ordem das quarenta pessoas
Todas as semanas surgem caras novas. São mobilizados por camaradas que vieram, gostaram e integraram-se na comunidade. Outros vêm por curiosidade mas integram-se rapidamente.
O que será que une esta gente que na maior parte das vezes não conhece ninguém e passados uns minutos estão em amena cavaqueira com  o vizinho do lado ou com o camarada que por ventura pisou as mesmas picadas, pese embora noutra época, em que a "temperatura da guerra" estava mais ou menos quente?
Não é, seguramente, o menu, sem que tal se deva desprezar. 
A Guiné marcou-nos. Temos uma linguagem própria. As aventuras e desventuras que vivemos durante a guerra interligam-nos e desafiam-nos a (re)viver aquele tempo longínquo.
Senti-mo-nos como que irmanados e sobretudo compreende-mo-nos uns aos outros.
As fotografias que se seguem, obtidas pelo paparazzi Peixoto são o reflexo destas vivências.
 Na saudável cavaqueira enquanto não se houve o "toque" para o Rancho



As conversas continuaram animadas dentro da Sala







Um bando de "periquitos e periquitas"  apareceram  como vem sendo hábito para dar nova força à Tabanca.
 Felizardo! encontrou cinco camaradas da sua Companhia.
 De Ponte de Lima, acompanhado pelo amigo e esposa
 O Nascimento trouxe a filhota para que esta saboreie a nossa amizade
  Foi a vez do Vitorino nos apresentar a sua filha a Márcia nossa colaboradora na solidariedade com a Guiné
 Olha que par de jarras! O Vitorino e a Márcia, sua filha
 Este Camarada e amigo quis deixar a sua marca solidária contribuindo para o Projecto "Sementes e água potável para a Guiné-Bissau
 De Ponte de Lima até Matosinhos, apesar de estar há mais de 20 anos a sofrer dos maleitas que a guerra lhe deixou no corpo.
Zé Teixeira

sexta-feira, 13 de maio de 2011

P560-AS CRÓNICAS DO ZÉ RODRIGUES

CRÓNICAS DAS MINHAS VIAGENS À GUINÉ-BISSAU
A PRIMEIRA VIAGEM – 1998


5 – O DIA SEGUINTE, NO XITOLE COM AS PESSOAS


Após uma noite bem dormida e todos manifestamente bem dispostos, voltamos à estrada para mais um dia “fora de casa”, novamente a caminho do Xitole. Aqui chegados, a motivação eram agora as pessoas. Sabiam que viríamos. Os Homens e as Mulheres Grandes eram hoje em maior número.
Xitole-Novo posto de saúde e ao lado o novo poço
De muito poucos me lembrava. Uma Mulher Grande, de quem não recordava o nome, mas que reconheci sem grande dificuldade, era uma das esposas do proprietário dum camião civil que quase sempre integrava as colunas de reabastecimento ao Xitole. Ela e o Saido Baldé, eram os nossos principais interlocutores, talvez porque falando um Português, aqui e ali mesclado com o crioulo, facilmente se faziam entender.
Final de tarde junto à piscina do Capé
Com uma mistura de sobriedade e de altivez, trajavam de vestes tradicionais e tinham uma memória soberba. Comecei a sacudir a poeira do baú das memórias. Ouvi falar de quem conhecera e dos que já haviam desaparecido. Ouvi falar de quem já não lembrava e daqueles que me foram mais próximos. Ouvi falar de quem esperava encontrar e que, por razões várias, não o consegui.
Jantar junto da piscina
Ouvi falar do antes e do agora das suas vidas. Ouvi os lamentos de uma vida dura e sem esperança e, ouvi falar com nostalgia dos tempos da nossa presença. Saltavam os nomes do Capitão .. do Alfero.. do Furriel.. que até tocava viola, do Formeiro .. etc. etc. etc..  Era patente a alegria com que falavam desses tempos. Foi com alguma dificuldade que consegui disfarçar a emoção, sempre que faziam essas referências. Paternalismo ou outro qualquer “ismo”? Naquele momento, eu tinha uma certeza. Era somente um ser humano, tocado pelos afectos forjados à muitos anos em circunstâncias particulares e que os deixava fluir sem mais “embrulhos”, na presença daqueles que a vida colocara no seu caminho. Estava feliz entre “a minha gente”.
Danças tradicionais mandingas
O Saido Baldé era difícil esquecer. Com uma fisionomia muito peculiar, em que sobressaíam uns olhos que pareciam querer saltar a qualquer momento das órbitas, era um homem feliz. Não nos largava um minuto. Mas não tinha as notícias do Galé Djaló que eu esperava ouvir. Impunha-se uma nova ida a Quebo (Aldeia Formosa) na companhia do Saido.
Momento junto à ponte do Saltinho
Voltaríamos a fazer o nosso almoço pic-nic junto dos rápidos de Cussilinta, com nova paragem para um cafezinho no Saltinho. Quebo, era a derradeira tentativa para encontrar o camarada de “profissão” com que privei, de forma quase fraternal, durante a minha permanência no Xitole. Um bom Camarada e Amigo, que a “sorte” não permitiu rever.
Rio Corubal-piscinas naturais nos rápidos do Cusselinta
Se dúvidas houvesse, logo ali ficaram desfeitas. Eu tinha que voltar á Guiné. São tantos os motivos que nos “puxam” para aquela terra que, somados à necessidade de rever Galé, tornaram firme essa ideia. Eu sabia que iria voltar e, disso fiz promessa e anúncio em Quebo e o repeti no Xitole, para onde nos dirigimos novamente.
Tabanca de Cambessé
Eram os nossos últimos momentos no Xitole. Aproveitamos para dar mais uma vista de olhos, principalmente pelas redondezas do quartel. Sempre na companhia do Saido, aventuramo-nos ali para os lados da antiga picada, no sentido de quem vinha da “Ponte dos Fulas”, do antigo poço de que se abastecia o quartel e da casa do comerciante libanês Jamil. Ali por perto, a picada tinha virado trilho, o poço, que já fora substituído, estava abandonado e meio escondido e o alpendre da casa do Jamil ameaçava cair, apesar do interior estar em razoável estado de conservação. Ao que parece, esta casa teria sido utilizada para alojamento do pessoal da empresa que construiu a estrada alcatroada. Não fora o novo posto de saúde e uma outra construção nova, e aquele local mais parecia uma cidade fantasma. Foi o último olhar sobre o Xitole. A despedida foi difícil. Algumas lágrimas envergonhadas caíram pelo meu rosto. Eram o tributo do meu carácter à reconciliação com as memórias do passado e, a expressão dos meus afectos pelas gentes do Xitole. Estava a despedir-me e já sentia saudades. Desisti de procurar as explicações para o meu estado de alma. Era o “eu” de agora. Aquela mistura do “eu” com vinte e três anos e o “eu” com cinquenta e um anos de idade. Tantos e tantos anos a sonhar em voltar ao Xitole e já estava de partida. Emocionado, deixei aquelas gentes e aquela terra. Eu sabia que iria voltar, porque há mais mundo no nosso coração para além da nossa vida, neste cantinho à beira mar plantado. Os que me acompanhavam nesta viagem, estavam tão longe, ou não, de entenderem a guerra das emoções que estava a travar e que, com dificuldade, me esforçava por controlar.
Regressamos ao Capé para um resto de tarde na piscina e para dois dedos de conversa com os gestores do empreendimento turístico, senhor Fernando e D. Margarida. O senhor Fernando, para além de ter sido funcionário da Caixa Geral de Depósitos em Lisboa, era também um ex-combatente na Guiné. Gente simpática e com talento na arte de bem receber, e que decidira tentar a “sorte” na Guiné. O número de hóspedes tinha aumentado substancialmente. Contamos mais sete casais. Segundo o senhor Fernando, estes casais integravam médicos oriundos da Cidade do Porto e teriam vindo de avião até Dakar, prosseguindo depois de Jipe até Bafatá e, segundo nos confidenciou depois, estariam ali a expensas de um conhecido laboratório farmacêutico. Talvez pelos muitos hóspedes, ou por ser a nossa última noite no Capé, fomos brindados durante o jantar e ao redor da piscina, com a exibição de um grupo de danças tradicionais da etnia Mandinga. Batuque forte e ritmado, jovens de ambos os sexos vestindo trajes tradicionais e dançando coreografias ancestrais. Espectáculo soberbo. No final, os hóspedes acabaram misturados com os “artistas”, na vã tentativa de os acompanharem. Era a noite de despedida da região centro da Guiné-Bissau e dos locais que mais me marcaram. Fomos dormir. Amanhã, é o regresso a Bissau para a descoberta de uma “outra” Guiné.
Continua…………