CRÓNICAS DAS MINHAS VIAGENS À GUINÉ-BISSAU
A PRIMEIRA VIAGEM
2- Acompanhem-me, até ao nascer do primeiro dia em solo da Guiné-Bissau
Éramos quatro pessoas, dois irmãos e suas esposas. Aprazamos a data da partida do Porto com destino a Bissau para o dia 5 de Abril de 1998. Já na posse dos bilhetes de avião, dos seguros e das vacinas, a minha cunhada, uma senhora francesa pouco dada a arriscadas aventuras, convenceu-me a contratar os serviços de um guia/segurança, exigência que me apressei a concretizar. A minha esposa, preparava-se para ter o seu baptismo de voo. Chegamos a Bissau ao início da madrugada. Desse momento guardo imagens e emoções de grande impacto. À saída do aparelho e, apesar da hora, eram aquele calor e aqueles odores que senti tão familiares. Era a primeira confrontação com os registos que a minha memória retinha. Sentia uma imensa e inexplicável alegria, como aquela criança a quem oferecem o brinquedo que já não sonhava receber. Só por vergonha e algum pudor, não beijei o solo que acabara de pisar. Era um momento único. Percebi que amava aquela terra, que senti também como minha. Amo esta terra não porque tivesse que ser. Mas porque, pela mais singela das ofertas ou por cada abraço partilhado com as suas gentes recebemos em troca demonstrações de gratidão e afecto. E, quando nos tocam assim, ficamos rendidos ao brilho de felicidade daqueles olhares, que é a forma mais genuína de nos dizerem como somos bem-vindos na sua terra. Só quem como nós, que aqui deixamos parte da nossa juventude, entenderá este turbilhão de emoções. Sentia-me tão feliz e tão jovem, que cheguei a duvidar que já haviam passado 26 anos desde que havia-mos partido.
Os que me acompanhavam, limitavam-se a gerir o sufoco do calor, a tentarem decifrar o que conseguiam ver e, a registar as minhas reacções.
O dia da chegada do voo semanal da TAP era uma verdadeira romaria junto da antiga gare do Aeroporto Osvaldo Vieira. Era um mundo de gente que nos olhava com naturalidade, era o amarelo e azul dos táxis e dos toca-toca, na expectativa de um serviço. As primeiras impressões diziam-me que havia uma ligação muito forte a tudo o que vinha de Portugal. Não senti qualquer sentimento de insegurança. Tinha sido a terra de todos os medos e agora era a terra da descoberta de tudo e de nada. Lá estava o guineense que nos iria transportar, ostentando uma placa identificando o Hotti-Bissau. Assim se chamava o Hotel em que ficaríamos alojados na primeira noite, ou o que dela sobraria. Deitamo-nos já alta madrugada. Dormir não seria propriamente a minha prioridade. O que mais ansiosamente desejava era assistir ao nascimento daquele primeiro dia, aos primeiros brilhos do Sol por detrás daquela palmeira que estava no caminho do meu olhar, lá para os lados da cidade de Bissau.
Debruçado na janela do terceiro piso do hotel virada para a avenida e, munido da minha Sony, esperei por esses momentos. Defronte do hotel ficavam dois edifícios de três ou quatro pisos, que na época eram ocupados pela cooperação dos países de Leste e, um pouco mais à esquerda, uma estrada cruzava a avenida. Registei os primeiros raios do Sol, até que o seu brilho me castigou, e assisti assim ao nascimento daquele desejado dia que se adivinhava prometedor. Junto à vedação, do lado exterior do hotel, uma papaieira exibia os seus frutos e logo ao lado, lá estava uma paragem dos transportes de passageiros. Era o amarelo e azul dos táxis e dos toca- toca. De todas as direcções surgiam pessoas. Começava o formigueiro humano, num vai-vem agitado de quem procura sobreviver conforme as condicionantes desta terra.
Todos os meus sentidos, estavam agora preparados para saborear novas emoções.
Bem cedo, começamos a fazer os preparativos para desfrutarmos do primeiro dia de viagem, que nos iria levar até Bafatá.
Continua…..
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